Afinal de contas, a que território eles se referem ou se referiam? Amostrar os percalços e os percursos sacramentados por inúmeros projetos e inúmeros programas que visavam e visam os agricultores e as agricultoras familiares com dinheiro do governo federal e da cooperação internacional encandearia os vazios de diagnósticos e os vazios de projeções elaborados a partir de materiais de uma lavra insignificante. Esses diagnósticos e essas projeções “magistrais” renderam e ainda rendem dolorosas antevisões de um futuro imprevisível e imprestável para a agricultura familiar e para o extrativismo maranhenses.
Apesar do futurismo abstrato das hordas da refinaria Premium, em Bacabeira, das hordas das mineradoras de areia até em área quilombola e em área de assentamento federal, em Rosário e em Presidente Juscelino, e das hordas da Suzano e suas terceirizadas, em Urbano Santos, Santa Quitéria, Anapurus e Barreirinhas, as comunidades agroextrativistas do nordeste maranhense, e ai entram os Lençóis maranhenses, o Baixo Munim e o Baixo Parnaíba, digressionam e regressam para e ingressam em vastíssimos territórios da fruta mangaba, da fruta bacuri e da fruta mirim.
Enquanto a iniciativa privada recorta o Maranhão para seus fins exclusivos e excludentes de investimentos vultosos com aportes do BNDES, do BNB, do BASA e do Banco do Brasil, as comunidades agroextrativistas, as entidades representativas dos trabalhadores rurais e as organizações não-governamentais agraciam o estado e sua população com o de melhor da zona rural.
Entre os dias 18 e 19 de dezembro de 2010, ocorreu a Feira da Reforma Agrária e da Economia Solidária da Região do Munim, no município de Morros, em uma promoção da Associação Agroecológica Tijupá e do INCRA e com a participação de várias comunidades de Morros, Cachoeira Grande, Presidente Juscelino, Rosário e Bacabeira.
As mercadorias variavam de polpa de fruta da mangaba até garrafas de mel orgânico. A discussão da agroecologia baliza a produção da agricultura familiar e do extrativismo no Baixo Munim. Alguém queria comprar mudas de mangaba na barraca da comunidade de Patizal e haviam vendido todas. O que ficara de mãos abanando voltou à carga; queria saber se plantava mangaba em qualquer lugar. Uma senhora de Bom Jesus se intrometeu na conversa e respondeu que a Mangaba se formava no Cerrado e por isso nem pensar em plantar mudas de mangaba em lugares úmidos. Podia se categorizar a mesma coisa sobre o Bacuri, entretanto essa espécie surpreende a todos com seu espaçamento que, numa comunidade de Santa Quitéria, entranhava-se na terra até bem próximo do rio Preguiças.
Em um dos assentamentos de sua atuação, a Tijupá propôs aos assentados que destinassem uma área de mais de mil hectares exclusivamente para o extrativismo de frutas como bacuri e como a mangaba. A demanda por polpa de fruta se acentua e as comunidades estão desprovidas de meios para responder aos pedidos que surgem para a compra da polpa.
Essa descapitalização se flagra em lugares como Santa Quitéria no Baixo Parnaíba maranhense e isso não é de agora e nem acabará tão cedo se depender dos governos. Os governos capitalizam empresas como a Suzano Papel e Celulose na forma de empréstimos ou na forma de aceitarem as grilagens de terra ou mesmo aceitarem que imensas áreas se disponibilizem para seus futuros plantios de eucalipto. Uma dessas áreas fica justamente em Santa Quitéria e nela se delatava um tal de bacuri bom, quer dizer, uma porção de bacuris de polpa de altíssima qualidade. Em uma das atividades do projeto Manejo de Bacurizais, com financiamento da ong alemã ASW, no pólo Coceira, resgatou-se brotações desse bacuri bom de uma área desmatada pela Suzano para que os agricultores plantem em seus territórios de extrativismo.
Em sua declaração de impostos, a Suzano dificilmente detalharia a origem de determinadas áreas com receio de ser pega. Com relação a essa área desmatada e que está em litígio com o plantador de soja Gilmar, a Suzano Papel e Celulose afanou mesmo o erário público. Comprova-se essa denúncia com o seguinte edital de leilão e de intimação de 2002: “A venda de uma posse de terras de lavrar e criar no povoado Coceira, data Facão, com área de 2059 hectares.” Lavrou-se o documento da terra no ano de 1983 em nome de Bernardo Nunes. Imaginar uma posse desse tamanho requer muitos pontos de exclamação. Pelo que consta no pólo Coceira, o senhor Bernardo Nunes é um dos tantos grileiros da região.
Por Mayron Régis